O redesenho do modelo de negócios e a transição para a fase da Concessionária 6.0.
O próximo nível dos negócios no setor automotivo e nas redes de concessionárias não se dará pela chegada dos carros elétricos, autônomos ou movidos a hidrogênio verde no mundo real, o nosso, ou no mundo virtual, o Metaverso. A evolução exponencial da tecnologia cria novas necessidades e gera comportamentos diferentes nos consumidores, legisladores, ambientalistas, educadores, empreendedores e agentes financiadores.
O dinheiro continuará existindo em ambiente virtual; é um caminho sem volta. A demanda pela responsabilidade socioambiental, com impactos na cadeia econômica, também é consequência da consciência que nasce a partir da evolução tecnológica, seja para o bem, no caso das facilidades e melhorias na qualidade de vida da sociedade, seja para o mal, no caso do consumo de minerais nobres e metais terras raras, danosos ao meio-ambiente em seus processos de extração e refino, utilizados nos sistemas de armazenamento de energia (baterias) e cuja demanda deve crescer muito nos próximos anos. O que você verá a seguir é uma evolução tecnológica que, entre outros efeitos, aumentará a distância e a segregação entre países desenvolvidos e os países em desenvolvimento. O Brasil não pode ficar com um pé em cada barco, mas há boas perspectivas.
A evolução das concessionárias de veículos. Estamos na Fase 5.0, a caminho do próximo nível e em alta velocidade
Para compreender a relação entre o desafio das concessionárias no próximo nível de negócios e o modo como as redes de concessionárias chegaram até aqui, é preciso olhar pelo retrovisor e entender o que já aconteceu e os desafios que as redes de concessionárias passaram e superaram nas últimas décadas.
Entenda, por qual razão as concessionárias no Brasil estão na Fase 5.0, iniciando a transição para a Fase 6.0.
Concessionária 1.0 (1910-1950). ESTRUTURAÇÃO. Nesse período surgem os primeiros agentes importadores de veículos; começam as primeiras montagens em CKD no Brasil; nasce o mercado de peças e carros usados e surgem os revendedores autorizados.
Concessionária 2.0 (1950-1995). CONSOLIDAÇÃO. Instalam-se no Brasil as montadoras e as fábricas de autopeças; os primeiros contratos de concessão são assinados. Nasce a ABRAVE (Associação Brasileira de Revendedores Autorizados, 1965); as revendas se unem em associações de marca; estrutura-se a legislação, direitos e deveres no setor com a Lei Renato Ferrari em 1979 e a PCCE (Primeira Convenção das Categorias Econômicas) em 1983. Surgem os indicadores de gestão na administração das concessionárias e o DEF (demonstrativo econômico e financeiro) torna-se instrumento oficial de avaliação de desempenho do negócio. São implementados os primeiros Fundos de Capitalização das concessionárias e também, novos sistemas de financiamento do atacado e varejo, enquanto as matrizes das montadoras ainda não entendem o funcionamento dos “Consórcios” no Brasil. Nasce a FENABRAVE em 1989. Os caros deixam de ser “carroças” (Collor abre o mercado à importação, que estava fechado desde 1976).
Concessionária 3.0 (1995-2012). EXPANSÃO. Com a importação, novos padrões de qualidade, tecnologia e desempenho moldam o desejo e a consciência dos consumidores. Ocorrem as primeiras sucessões estruturadas nas concessionárias e nos grandes grupos; primeiras reestruturações e consolidações de grupos multimarcas (grandes grupos passam a representar várias marcas de veículos ao mesmo tempo, coisa que, em décadas recentes seria considerada grave infração contratual, passível de cancelamento da concessão por justa causa); expansão das redes em capilaridade; novas tecnologias de gestão e controle, treinamento a distância; internet, telemetria e vendas virtuais. Fim da fidelidade às marcas. Cresce o mercado paralelo, e-commerce e vendas ativas. O mercado interno atinge volume recorde de vendas em 2012 e fecha-se o ciclo do período de ouro no setor.
Concessionária 4.0 (2012-2020). REESTRUTURAÇÃO. Chegam novas marcas e novas montadoras. O mercado doméstico projeta um volume de cinco milhões de veículos para 2016 e o parque industrial do setor se estrutura para isso, mas as vendas naquele ano alcançam apenas dois milhões de unidades; a ociosidade perdurou, com reflexo nas redes de concessionárias. Aumentam a concorrência e as demandas por profissionalização da gestão e governança nas concessionárias. Há uma sequência de crises políticas e econômicas resultando em prejuízos constantes e o fechamento de centenas de concessionárias. O setor busca por novas fontes de receita e redução de custos; transformação digital, internet das coisas, inteligência artificial, machine learning e novas tecnologias em veículos requerem novos investimentos dos concessionários e novas competências de gestão.
UM NOVO AMBIENTE DE NEGÓCIOS
Concessionária 5.0 (2022-2035-2040). REDESENHO DO MODELO DE NEGÓCIOS. Um novo cenário tecnológico, político, cultural e social exigirá uma radical mudança na forma de fazer negócios e ganhar dinheiro; novas formas de relacionamento com os consumidores e principalmente, entre as montadoras e as concessionárias. Teremos vários modelos de negócios convivendo juntos nas redes de concessionárias. O foco estará nas práticas e cobranças ESG, junto com um comportamento minimalista dos consumidores, apesar da chegada dos carros elétricos, equipamentos autônomos, comunicação 6G e 7G e realidade virtual. O Metaverso trará novas oportunidades de negócios e uma nova Economia. Haverá disputas pelo poder geopolítico, a internet será controlada do Espaço e o sistema Starlink de Elon Musk terá companhia e não estará sozinho. Poderemos ter novas guerras e conflitos étnicos, o que causará mais abalos nos sistemas produtivos globais. O desenvolvimento acelerado das tecnologias de comunicação, mobilidade, armazenamento de energia e biociência causarão grande distanciamento entre os países desenvolvidos e os países do 3º mundo. Uma nova corrida espacial será o cartão de visitas de novos players na ordem de poder mundial. O Brasil pode exercer um papel protagonista na redução da pegada de carbono no setor de transportes, a partir do setor sucroenergético, etanol, hidrogênio verde e produção do biometano.
É nesse cenário de grandes mudanças inevitáveis e a certeza de que pouco podemos prever os impactos de tudo isso nos negócios, que viveremos a transição da atual Fase 5.0 de gestão das redes de concessionárias para a nova Fase 6.0, um novo nível de negócios e relação com fabricantes, investimentos e consumidores.
Se você chegou até aqui neste texto e é concessionário de veículos, pode estar se perguntando: o que fazer? Os grupos concessionários com estrutura e governança corporativa estão a planejar o futuro dos negócios e para isso, buscam responder a várias perguntas, como estas a seguir:
- Quanto investir nos novos modelos de negócios?
- Como ganhar dinheiro com isso e obter retorno do investimento?
- Quem serão meus novos concorrentes?
- Quem serão meus novos fornecedores?
- Como o consumidor irá se comportar de agora em diante?
- Qual o grau de confiabilidade das novas tecnologias?
- Haverá mercado para os novos produtos, cada vez mais caros e destinados a parcelas menores dos consumidores tradicionais?
- A infraestrutura e a Economia permitirão projeções expansionistas em médio e longo prazos para o segmento da mobilidade no Brasil?
- Por quanto tempo meu atual modelo de negócios irá, ainda, sobreviver?
- Vale a pena continuar no negócio de distribuição de veículos ou seria momento de repensar as atividades da empresa e áreas de atuação?
- Se eu decidir sair do negócio agora, quanto vale a minha concessionária?
Apesar de tudo isso as pessoas continuarão necessitando de mobilidade inteligente, geração e armazenamento de energia, sustentabilidade econômica e ambiental, alimentação, saúde, segurança, educação, assistência técnica, autoestima, realizações pessoais, convívio em sociedade e principalmente, um bom sinal de internet. É nesse ambiente que as concessionárias de veículos continuarão a existir no Brasil pelos próximos vinte e cinco anos; depois disso, não há como garantir. Na Fase 6.0, provavelmente as redes de concessionárias não existirão mais, sendo substituídas por grandes parcerias multilaterais e a atuação direta dos prestadores de serviços junto ao cliente final, sem eventuais intermediários. Tudo irá mudar, os serviços, os produtos, as competências, as demandas.
Orlando Merluzzi (*)
(*) Sócio na MA8 Consulting Group, estrategista de negócios e especialista em gestão e governança, é consultor, conselheiro de administração, palestrante e atua no setor automotivo há 37 anos, dos quais, 30 anos dedicados ao relacionamento entre concessionárias, montadoras e associações de marca.
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