O futuro da indústria automobilística no Brasil. Mais razão, menos paixão.

Qual o futuro do setor automotivo no país? Há espaço para mais montadoras nesse mercado?

Procure entender as entrelinhas do gráfico, do texto e das tendências, com a razão e sem paixão.

São 28 fábricas com linhas de montagem de veículos (carros, comerciais leves, caminhões e ônibus), sem contar dezenas de unidades industriais separadas para fabricação de motores, cabines, chassis, componentes ou centros de distribuição.

São mais de 55 marcas no país, sendo que, em carros e comerciais leves, apenas oito fabricantes respondem por 85% do mercado. O segmento de caminhões 3,5ton representa 80% de todo mercado de veículos cargo-diesel vocacional e nele, são seis montadoras que detêm 99% do mercado. Em ônibus, também seis fabricantes respondem por 99% do mercado.

O setor automotivo no Brasil, incluindo a cadeia logística e o “aftermarket”, gera mais de 6% do PIB do país.

As novas tecnologias exigirão novos e bilionários investimentos e em destaque, veículos elétricos, híbridos, células de hidrogênio, biometano, super conectividade, veículos autônomos, fábricas de baterias, desenvolvimento para novas tecnologias de baterias em estado sólido, redes de carregamento etc.. Um estudo da MA8 aponta que, somente para as gigafactories dos elétricos (baterias) estão previstos investimentos no mundo, da ordem de quinhentos bilhões de dólares até 2031. Isso equivale, quase, ao PIB da Suécia.

OICA 2022

Olhando para o gráfico, no qual Ásia, EUA e Europa Ocidental detêm mais de 85% do mercado mundial de veículos, se você fosse responsável pela decisão de novos investimentos de uma montadora global, para quais países ou regiões você direcionaria seus recursos?

Quando a Ford encerrou atividades de produção no Brasil, de forma objetiva, honesta e transparente alegou que, a partir de agora, direcionaria seus investimentos para as novas tecnologias de veículos, em países da Ásia e EUA. Uma decisão estratégica que faz todo sentido e a partir desse ponto, vender na Europa é consequência. Já em relação a General Motors, quando seu ex-presidente no Brasil ameaçou, em janeiro de 2019, deixar o país, faltou transparência na desastrosa declaração e certamente ele não tirou tais palavras de suas próprias conclusões.

O passado recente é a realidade que temos para projetar o futuro e os próximos três anos poderão definir a permanência ou não de algumas marcas no país. Definitivamente, o Brasil não pode mais ter dois anos seguidos de ‘pibinho’ e como eu já vi quase de tudo nesse setor em mais de trinta e cinco anos, não me iludo com euforias momentâneas, portanto, ‘barbas de molho’, montadoras não são entidades beneficentes (nem as redes de concessionárias). 

O tamanho do mercado justifica a presença, produzindo ou importando

O Brasil já respondeu por mais de 4% da produção mundial de veículos e hoje não atinge 3% (2,7%). Em condições normais de temperatura e pressão, as grandes montadoras não direcionariam novos recursos para o Brasil, seja pela insegurança mercadológica, seja pela falta de previsibilidade, ou questões econômicas, mas justifica, sim, estar presente no país pelo próprio tamanho do mercado. Por isso, legisladores, formadores de opinião e stakeholders da cadeia automotiva devem, de modo uníssono, fomentar e apoiar o desenvolvimento de tecnologias locais para produção e utilização de energia limpa e renovável. O setor sucroenergético é o futuro da indústria automobilística no Brasil. Carros elétricos também terão seu espaço, mas a participação será minoritária.

Investimentos no setor automotivo no Brasil ou na Argentina podem não se justificar na última linha do business case, mas estrategicamente, quem teria coragem de tirar o pé do continente sul-americano? Algumas decisões se justificam pelos números, outras são estratégicas territoriais.

Orlando Merluzzi (*)


(*) Sócio da MA8 Consulting, consultor de empresas, conselheiro independente e especialista em gestão, governança e planejamento estratégico, atua no setor automotivo há mais de 35 anos.

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